Fotografar não é simplesmente fixar o mundo — é rasgar o véu da aparência para, enfim, ver. Ver com os olhos abertos da consciência, ver com o silêncio depurado da alma.
Não se revela luz enquanto o olhar permanece ensombrado. É preciso que o fotógrafo desperte antes da imagem: que transmute o seu próprio interior, que desfaça os nevoeiros íntimos, que refine a sua escuta visual até que o instante se torne epifania.
Toda fotografia autêntica é uma operação simbólica. A objetiva não é apenas uma ferramenta ótica — é uma extensão do ser. Regista o visível, sim, mas sobretudo deixa entrever o invisível: o gesto subtil do sentir, a cartografia das emoções, o sopro essencial do que ainda não tem nome.
A obra fotográfica nasce do interstício entre o mundo e o sujeito. E nesse intervalo, mais do que representar, ela revela — não o que está fora, mas aquilo que foi transformado dentro.
A câmara capta, mas é a consciência que imprime. Por isso, a maior oferenda de um fotógrafo ao mundo não reside naquilo que mostra, mas no que se purificou para ver.
A auto-transformação é o verdadeiro diafragma da arte. Quanto mais se abre, mais luz — lúcida, ética, íntegra — penetra na imagem. E é essa luz que, sem ruído nem ornamento, desperta o outro.
Porque toda fotografia desperta é, em si, um acto de inclusão.